segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Fechamentos e sequências

Eu tinha uma agonia com assuntos mal resolvidos e a sensação de que tudo precisava ser concluído. Se não deu certo, vamos encerrar e começar novas coisas, novos planos. Vamos encerrar o ciclo, o projeto, descartar o que falhou e abrir uma nova página, branquinha de tudo. Pronta para o sucesso.

Então me dei conta de que é mais uma paranóia do que uma coisa que dê resultado, de fato. É lindo, rende pauta no jornal e tema para campanhas publicitárias emocionantes.

E, você sabe, fim de ano é propício pra entrar nessa coisa de "ano novo, vida nova, limpa tudo e começa do zero". Tudo induz a começos e recomeços. Olhar pra trás, analisar o que não funcionou e tentar de novo. E, se for pensar bem, é muito confortável essa ideia. Tudo pode ser recriado em algum momento.

Não que recomeçar não seja bom - é ótimo. Mas não precisa acontecer o tempo todo. Dá para continuar muita coisa. E dá pra consertar o que está errado. Dá pra melhorar o que está mais ou menos. Dá pra embelezar mais o que precisa só de um retoque. Não precisa arremesar na parede e jogar fora. As coisas podem ter continuidade e isso pode ser maravilhoso.

Um dia confessei a uma amiga essa angústia de querer "fechar ciclos" com pessoas por meio de conversas sinceras e doídas e o que ouvi fez todo o sentido desse mundo: "Gislaine, você não precisa fechar nada com ninguém, precisa fechar é dentro de você mesma, é aqui, ó", e apontou pro coração. Sim, é no coração que eu tenho de fechar os assuntos inconclusos que carrego a vida inteira. E não preciso enviar e-mails ou agendar conversas para vir com um "lembra daquilo que eu fiz há dez anos, então, eu queria falar sobre isso". Ou de um momento solene de desculpas por parte do outro, algo oficial e que você possa grudar na parede e dizer "eu sabia que estava certa".

Claro que às vezes é bom ouvir da boca de alguém que te machucou um "me desculpe" e aí você vai lá e diz tudo o que sentiu/pensou/cogitou. Mas nem sempre é a solução mais tranquilizadora, porque a mente humana não encerra um pensamento como quem encerra o expediente às 18 horas. As coisas continuam. Os sentimentos permanecem, ainda que diferentes. Assim, encerrar ciclos é mais uma ansiedade gerada pela necessidade do eterno recomeço, como que para manter a ilusão de que tudo pode ser perfeito, como manda o figurino.

Projetos inacabados ou nem começados

Por esses dias de final de ano eu comecei a pensar em projetos que coloquei no papel (e os deixei ficar, por tempo indeterminado) e nunca os concluí (ou mesmo comecei). O livro que tanto queria escrever, ações sociais com animais de rua, ideias de empreendedorismo, planos de fazer cursos dos mais diversos temas, tudo isso continua ali, aguardando um passo a mais. E então me ocorreu aquela coisa típica de "vamos apagar tudo e começar novas coisas em 2015". Vamos ali apagar as 50 páginas do livro já escrito, você nunca vai terminar ele, mesmo. E foi quase. Quase.

Sério, é TÃO tentador apagar, apenas.

Aí, olhando pra janela do meu apartamento as pessoas indo e vindo e se exercitando na praça às 9h da manhã de um domingo (sim, elas fazem isso), me dei conta de que a vida é esse estranho movimento de começar e parar, retomar e depois desistir, querer e depois querer algo ainda melhor e então dar um tempo. E recomeçar. E que não há absolutamente nada de errado com isso.

Eu posso, sim, manter os meus planos e projetos que se arrastam há anos na minha cabeça ou nos meus papéis e agendas e pode ser que um dia eu conclua qualquer um deles. Ou não. Pode ser que nunca sejam realizados. E estará tudo bem dessa forma, também. Não há indicadores de sucesso ou critérios a cumprir para ser mais ou menos feliz, consiga você realizar 100 ideias ou apenas uma ou mesmo nenhuma. E isso alivia de um modo incrível o peso que a gente mesmo cria pra vida, que vai colocando nas costas, essa mania de querer fazer tudo e tanto o tempo todo.

Apesar de qualquer coisa poder ser realizada, na verdade nada precisa ser feito. E está tudo bem assim.


terça-feira, 28 de outubro de 2014

Senhas e padrões

Tem vezes em que me dou conta que somos muito mais parecidos com os outros, com qualquer um na rua, no trabalho ou até mesmo com quem está do outro lado do mundo, do que é confortável imaginar (em geral quando me pego reclamando de outras pessoas e me dou conta que o que me incomoda nelas é algo que tenho em mim mas não consigo aceitar; reconhecer os próprios defeitos no outro é cruel).

E digo que é confortável imaginar que somos pessoas únicas porque há algo de bacana em se considerar diferente dos outros, em algum aspecto qualquer, mesmo que apenas para ter um pouco de espaço para exercer a própria individualidade. Mas, sim, somos parecidos (e que ótimo, afinal, somos humanos).

Veja a forma que escolhemos para criar senhas, por exemplo. A maioria das pessoas seguem padrões convencionais: sequências numéricas, datas importantes, nomes de filmes ou celebridades, nome do cachorro, números de documentos pessoais. Um exemplo: a polícia dos Estados Unidos localizou, pela primeira vez, uma pessoa acidentada tendo como fonte de informação os dados do GPS do Iphone da vítima. Para fazer isso, bastou acessar o Ipad da moça e usar o recurso "Find My Iphone". Até aí, tudo normal. Só que, para acessar o Ipad da tal moça, o detetive teve de descobrir a senha de desbloqueio do dispositivo. E não foi nada difícil. Veja:




Um palpite baseado em uma série de números comuns que as pessoas usam para criar senhas e... pronto.

Em um conto chamado Silver Tape, a escritora Mara Coradello diz:
"O previsível seria nunca mais ligar. Nem eu e muito menos ele. Para aguentar a privação vasculho coisas e pessoas o tempo inteiro. Descubro o login dele e a senha. Incrivelmente as mesmas palavras. Ninguém nunca acha que o outro vai querer saber assim de nós de forma desleal e surrupiar as senhas? Eu acho que sim. Eu vou sempre tentar descobrir o que você não fala. Às vezes sonho. Em outras sou antiética. Não que meus sonhos também não sejam antiéticos".

Previsibilidade humana, previsibilidade humana, previsibilidade humana. Poderia ser um mantra ou uma frase escrita no quadro pelo Bart na abertura de Simpsons ou uma sequência para escrever no caderno de caligrafia na escola.

Será que é assim na vida, em geral, também? A gente segue os padrões mais óbvios, facilmente reconhecíveis, sem pensar se é de fato seguro/inteligente/o melhor que pode ser feito? E estamos todos em risco?

E, será que, apenas por preguiça mental vale a pena manter os mesmos padrões?

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Limpando os carmas e começando de novo


Muita coisa aconteceu desde que comecei meu último blog. O ano era 2010 e o mês, dezembro. Eu praticamente nem tinha completado um ano morando em Curitiba, cidade que me prometia tanto e tudo e... oh.

Trabalho, namoro, amigos, ruas, cachorros, parentes, músicas, demissões, expectativas, mais quilos, fins de namoros, menos quilos, mais dinheiro, casa nova, menos dinheiro, terapia, academia, pós-graduação, família perto e depois longe, um bebê na família e depois a perda que doeu (e ainda dói) pacas. Mais ou menos isso aconteceu não nessa exata sequência. E nesse tempo, que se formos pensar nem é tanto assim, eu fui ficando mais ou menos feliz, mas com certeza um pouco mais cínica.

Era hora de recomeçar. Com um pouco mais de magia e cor nas palavras - que às vezes nem querem sair da garganta - e é por isso mesmo que elas têm (o quanto antes) de ser gritadas. GRITADAS, SIM, GRITADAAAS (ok, deixemos pra outra hora).

Os textos do último blog se alternavam entre a raiva da falta de significado da vida e a tristeza por não conseguir sentir o gosto dos dias como um dia, achava então, já havia conseguido.

Fiquei chata, depois legal, depois só uma funcionariazinha-padrão que anota todas as tarefas em post its.

Bem, foram quatro anos e eu não tenho condição de julgar se foram bons ou ruins. Não sei o que vai me acontecer nos próximos quatro ou dez, podem ser incríveis ou podem ser de dar dó. Mas, estes quatros já passaram. Então eu deixei de besteira, de remoer tudo só na minha cabeça e de achar que nada nunca vai ser melhor do que o melhor que já inventaram e já escreveram e... resolvi que ia começar de novo - que é uma das coisas que mais faço bem na vida.

Eu não posso prometer que não serei chata. Exagerada. Convenientemente mulherzinha. Nem tão verdadeira quanto gostaria, isso também é verdade. Não posso dizer que é tudo relevante. Mentira, posso sim: é tudo verdade e é tudo relevante.

E é meu.

Rá.


Foto: KCPhotographyy

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Desobrigação

Eu gosto da chuva forte porque ela te desobriga de fazer qualquer coisa. Ela é a desculpa perfeita pra não sair de dentro de você mesmo, não ir à rua, não telefonar, não comprar pão.

Ela deixa espaço para o que quer que você queira fazer, um intervalo mágico que pode ser aproveitado para o silêncio total e a falta de movimentos repetidos que tanto cansam todos os dias.

Depois dela, com a rua se enchendo aos poucos das pessoas com cara de que foram jogadas da cama com um empurrão direto para a calçada ainda com poças, há ainda a chance de dizer que a culpa é da mudança climática.

"E essa chuva, hein?"
"Você viu o temporal de ontem?"
"A previsão do tempo falou mas eu não acreditei."
"O trânsito parou na cidade toda, foi um caos." (pessoas dentro de seus carros aliviadas pela desobrigação mas fingindo stress pra não sair do papel de cidadãos ocupados e nervosos que lhes foi concedido)

E o atraso, o não cumprimento de prazos, a falta de atenção, o sumiço. Tudo perdoado.

A chuva é o atestado de ausência coletivo e simultâneo, a permissão que uma cidade inteira recebe para cancelar temporariamente a rotina e desaparecer da vista do resto do mundo.


quinta-feira, 14 de agosto de 2014

O saldo final de tudo

Tem uma música de que eu gosto muito, chamada "Chá verde", em que a cantora diz que o saldo final de tudo foi mais positivo que mil divãs. E é por isso que este blog existe. Porque é isso que escrever significa pra mim. Melhor que terapia, chocolate e dia chuvoso com filme velho na TV.

Escrever é melhor.

Então comecei de novo em um novo lugar que é pra ter aquela emoção de estreia.

Oi, mundo.